sábado
Não sou mulher?
“Diamante é o sonho de toda mulher”, afirmou a apresentadora de um programa de TV. Entrei em crise. Não sou mulher? Tá lá na certidão de nascimento: fe-mi-ni-no. Minha mãe se confundiu? O médico? O escrivão? Sou menino?
Volta a fita. Vamos editar a frase e acabar com a crise: Diamante é o sonho de QUASE toda mulher. Ok, ok. Agora, sim. Posso exibir em paz minhas bijus, que eu adoro. Sim. Adoro me enfeitar. As índias já gostavam. Não tenho nada a ver com isso. Só sigo a tradição. Me enfeito sim. Tenho um amigo que de tanto ver meus braceletes de diferentes cores e formas, me perguntou:
- Você gosta muito de usar isso, né?
Homem não entende o peso que o “isso” tem pra uma mulher, mas amigo a gente deixa passar. É, adoro isso. Mas tem que ser biju. Quem gastar seu dinheirinho comprando jóia pra mim pode ser que se decepcione com minha cara de caneca (aquela cara que fazemos nas brincadeiras de amigo invisível, quando pedimos o CD do Ben Harper e ganhamos uma caneca de alumínio: cara de caneca).
E é por não dar a mínima importância pra jóia que fiquei indignada com essa matéria que eu vi, você não vai acreditar onde: na TV CULTURA! Foi num programa chamado “Boletim Cultura”. A matéria falava de um diamante que vale R$ 12 milhões e que é o “sonho de toda mulher”. O texto foi piorando e culminou com o seguinte argumento da apresentadora: “Marilyn Monroe estava certa quando disse que o diamante é o melhor amigo da mulher”. Ui! Deviam ter continuado a matéria lembrando que Marilyn morreu sozinha e em depressão. Sonho de toda mulher? Poupem seus diamantes.
Por não me encaixar na personagem desta matéria é que sugiro ouvirmos com mais critério o que é dito pelos veículos de comunicação antes de tomarmos com uma verdade nossa. Tenho guardado um caderno especial que a Veja fez para “homenagear” a mulher. O suplemento traz matérias previsíveis sobre mulheres fortes que mudaram a história e blablabla. Mas a última matéria me surpreendeu de tão absurda. Traz dez coisas que a mulher "precisa" para ser feliz. Começou o disparate na ordem decrescente: lençóis de não sei quantos fios, sapato de não-sei-quem, bolsa tal, chegando ao desejo número 1. Qual? Ganha uma biju quem adivinhar. Diamante! Que raios de referencial de mulher que essa gente tem? Não sou Amélia, não sou de Atenas, não sou Geni e nem tampouco tenho sonhos de lençóis com um milhão de fios. E aí, não sou mulher? Voltou a crise.
Não ser igual a todo mundo é difícil. Em geral, a pessoa assim é taxada de radical. É a desagradável, que não vai na onda, que discorda. Como tenho a mania (não sei se é boa, mas tenho) de falar o que penso, em geral sou a chata quando o papo é muita grana ou coisinhas que a muita grana pode comprar.
Não acredito que toda mulher sonha com um homem que lhe dê um diamante nem tampouco que todo homem se sinta realizado ao encontrar mulheres que procurem por isso. Claro que existem pares afinados nessa busca. Que sejam felizes enquanto durar a grana, então. Não reivindico a dizimação desses seres. Só acho mais interessante conviver com a outra espécie, antes que seja extinta.
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Cleide Almeida é jornalista
cleidemaisfm@hotmail.com
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